"STF não julga ex-deputados, ex-senadores, ex-ministros, ex-procuradores! Por que seria competente para julgar um ex-presidente?", questiona Marco Aurélio Mello
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, criticou duramente a condução do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela Suprema Corte. Em declarações recentes, Mello afirmou que Bolsonaro deveria ser julgado pela primeira instância da Justiça, e não pelo STF, pois, ao deixar o cargo, ele passou a ser um cidadão comum.
“O STF julga ações contra ex-deputados federais, contra ex-senadores, contra ex-ministros de Estado, ex-ministros do próprio Supremo, ex-procuradores da República? Não! Por que seria competente para julgar um ex-presidente? O julgamento de Bolsonaro deveria ser na primeira instância, como também os inquéritos e as ações alusivas àqueles que participaram dos episódios de 8 de janeiro, cidadãos comuns”, declarou Mello.
Julgamento no STF compromete o direito ao recurso, diz ex-ministro
O ex-ministro argumentou que a manutenção do julgamento de Bolsonaro no STF compromete princípios fundamentais do processo legal, como o direito ao recurso. Segundo ele, qualquer cidadão tem direito a uma instância de revisão, o que não ocorreria caso o ex-presidente seja julgado diretamente pela Suprema Corte.
“O devido processo legal, o princípio do juiz natural, ficam prejudicados e a pessoa não tem direito a um recurso para outra instância, uma instância de revisão. A cidadania vai embora com isso”, afirmou Mello.
Para ele, a falta de um tribunal revisor nesse tipo de julgamento pode ferir os direitos fundamentais e criar um precedente perigoso para outros casos semelhantes.
Constituição estabelece limites para a atuação do STF
Marco Aurélio Mello enfatizou que a Constituição brasileira define claramente as competências do STF, e que o caso de Bolsonaro não se enquadraria nelas. Ele recordou um precedente de 2017, quando o ministro Luís Roberto Barroso propôs restringir o foro privilegiado, determinando que os crimes só deveriam ser julgados pelo Supremo se fossem cometidos no exercício do mandato e estivessem diretamente ligados à função pública.
“A própria Corte já decidiu em 2017 que o foro privilegiado só se aplica a crimes cometidos no cargo e relacionados ao mandato. Bolsonaro não é mais presidente e, portanto, não há justificativa para que continue sendo julgado pelo STF”, explicou.
Segundo o ex-ministro, essa decisão deveria servir de base para que Bolsonaro fosse julgado em instâncias inferiores da Justiça, como qualquer outro cidadão.
Mudança de entendimento do STF gera questionamentos
O ex-ministro também criticou o que considera uma mudança de entendimento da Corte em relação ao foro privilegiado. Para ele, há uma falta de coerência nas decisões do STF sobre o tema, o que pode comprometer a segurança jurídica no país.
“Agora mudaram tudo. Quer dizer, não mudou o direito, mas mudou a concepção sobre o direito”, concluiu Mello.
O ex-ministro sugeriu que essa mudança de posicionamento pode ter motivações políticas e destacou a importância da previsibilidade no sistema judiciário. Para ele, a interpretação das leis não pode variar de acordo com o momento político ou com quem está sendo julgado.
Repercussão das declarações de Marco Aurélio Mello
As declarações do ex-ministro repercutiram amplamente no meio jurídico e político. Juristas e advogados de diversas correntes ideológicas manifestaram opiniões sobre o tema, com alguns defendendo que Bolsonaro deveria ser julgado em instâncias inferiores, enquanto outros acreditam que, devido à gravidade das acusações, o STF tem competência para conduzir o caso.
Aliados do ex-presidente também reforçaram a tese de que o julgamento deveria ocorrer na primeira instância, alegando que Bolsonaro tem sido alvo de perseguição política.
Por outro lado, especialistas que defendem a competência do STF argumentam que os crimes investigados podem ter impacto institucional significativo, justificando a análise pelo Supremo.
STF ainda deve definir rumo do julgamento
A decisão sobre a competência para julgar Bolsonaro ainda pode ser alvo de debates dentro do próprio STF. A Corte tem o poder de reavaliar seu entendimento e determinar se o caso deve permanecer sob sua jurisdição ou ser encaminhado para instâncias inferiores.
Caso o Supremo decida manter o julgamento, Bolsonaro não terá direito a recorrer a uma instância superior, o que pode se tornar um ponto de controvérsia jurídica.
Independentemente da decisão final, a discussão levanta questões fundamentais sobre os limites do foro privilegiado e a imparcialidade do sistema judiciário, temas que devem continuar em pauta no cenário político e jurídico do país.