Câmara pode adotar mesma estratégia para blindar Zambelli após vitória de Ramagem

Política

A recente decisão da Câmara dos Deputados de sustar a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) provocou uma série de reações no meio político e jurídico. O episódio marcou o retorno do uso de uma prerrogativa constitucional pouco acionada nos últimos anos, prevista desde a Constituição Federal de 1988. Essa prerrogativa permite ao Legislativo barrar processos criminais contra seus membros, medida que não era utilizada desde a década de 1990.

A iniciativa da Câmara não apenas surpreendeu por seu simbolismo político, mas também reacendeu discussões sobre a independência entre os Poderes e o papel do Congresso frente às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). A medida foi aprovada por maioria e dividiu opiniões sobre os limites do foro privilegiado e a proteção parlamentar.

PL articula blindagem de Carla Zambelli

A decisão pró-Ramagem teve efeitos imediatos no tabuleiro político. Em reação direta, o Partido Liberal (PL) moveu-se para tentar aplicar a mesma estratégia em favor da deputada Carla Zambelli (PL-SP). No dia 29 de abril, o partido protocolou um pedido para que a Câmara suspenda o processo penal que tramita no STF contra a parlamentar.

Zambelli é ré por suposto envolvimento em um ataque hacker ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O caso, que remonta a 2018, ganhou força nos últimos meses com o avanço do julgamento no Supremo. Até o momento, quatro ministros votaram pela condenação da deputada, o que poderá acarretar não apenas a perda de seu mandato, mas também uma sentença de até dez anos de prisão.

A defesa da parlamentar sustenta que a acusação é frágil e politicamente motivada. No entanto, a tentativa de repetir o expediente usado para proteger Ramagem enfrenta barreiras jurídicas consideráveis.

Moraes barra tentativa de suspensão

O ministro Alexandre de Moraes, relator do processo contra Zambelli, foi categórico ao rejeitar o pedido de suspensão apresentado pela defesa no último dia 12 de maio. Segundo Moraes, a prerrogativa prevista no artigo 53 da Constituição só se aplica a delitos cometidos durante o exercício do mandato atual. Como a acusação contra Zambelli refere-se a fatos ocorridos em 2018, quando ela ainda não exercia cargo eletivo, o ministro negou o recurso.

A decisão de Moraes reforça a leitura de que a blindagem parlamentar não pode ser usada como escudo retroativo. Ainda assim, a movimentação do PL sugere que o partido aposta na força política da bancada para pressionar o Congresso a adotar uma interpretação mais ampla das prerrogativas.

Nos corredores da Câmara, aliados de Zambelli tentam construir um discurso de proteção institucional, argumentando que decisões como a do STF podem ferir a autonomia do Parlamento e abrir precedentes perigosos para o futuro.

Outros nomes sob risco no Congresso

O movimento em defesa de Zambelli ocorre em um contexto mais amplo de tensão entre os Poderes. Diversas lideranças do Congresso observam com apreensão o avanço de investigações e denúncias contra parlamentares no Supremo, temendo que o caso de Ramagem tenha criado um precedente capaz de ser explorado por diferentes forças políticas.

Entre os nomes que surgiram nos bastidores como possíveis alvos de medidas semelhantes está o ex-ministro das Comunicações Juscelino Filho (União Brasil-MA). Ele foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por suposto desvio de recursos de emendas parlamentares, o que culminou em sua saída do governo Lula no início do ano.

Apesar dos rumores, Juscelino negou publicamente ter solicitado qualquer ação da Câmara para suspender o processo contra ele. Em nota, o deputado afirmou que pretende se defender exclusivamente nos autos e confia no devido processo legal.

Câmara entre o jurídico e o político

A decisão da Câmara de intervir em um processo judicial em curso, como ocorreu com Alexandre Ramagem, levanta uma série de questionamentos sobre os limites institucionais do Poder Legislativo. De um lado, defensores da medida apontam que a prerrogativa constitucional existe justamente para impedir perseguições políticas e preservar a independência parlamentar. De outro, críticos alertam para o risco de transformar o Congresso em um escudo para impunidade.

Especialistas jurídicos divergem sobre a legalidade e a moralidade dessas ações. Para alguns juristas, o artigo 53 da Constituição é claro ao dar à Câmara e ao Senado o poder de sustar ações penais que possam comprometer o funcionamento do Parlamento. Para outros, a interpretação do texto precisa ser restrita, sob pena de minar a credibilidade do Judiciário e alimentar uma sensação de privilégio injustificável.

Próximos capítulos da crise institucional

A tentativa de blindar Carla Zambelli, mesmo diante da negativa de Moraes, deve ganhar novos desdobramentos nas próximas semanas. Há expectativa de que a Câmara seja provocada formalmente a deliberar sobre o tema, o que poderá acirrar ainda mais a relação entre o Legislativo e o STF.

O caso também deverá servir como termômetro político: a forma como a Câmara lidará com o pedido de Zambelli indicará o grau de coesão da bancada do PL, bem como a disposição da Casa de manter ou recuar do precedente criado com Ramagem.

No cenário atual, marcado por polarizações e disputas institucionais, o embate entre Parlamento e Supremo está longe de uma resolução pacífica. Cada novo movimento poderá não apenas influenciar o destino individual de parlamentares, mas também redesenhar os contornos das relações entre os Poderes da República.

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