Na manhã desta sexta-feira, 13 de junho, a cena que se desenrolava no Setor Militar Urbano (SMU), em Brasília, parecia mais um episódio de reviravolta política do que uma simples diligência judicial. Policiais federais estavam a postos, cumprindo o mandado de prisão contra o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), quando um novo despacho do Supremo Tribunal Federal mudou completamente o rumo dos acontecimentos. O responsável pela virada foi o ministro Alexandre de Moraes, que revogou a ordem de prisão em pleno andamento da ação da Polícia Federal.
Prisão Determinada e Depois Cancelada
A decisão de prender Mauro Cid foi tomada pelo próprio Moraes nas primeiras horas do dia, dentro do contexto de uma nova fase da investigação sobre suposta tentativa de obstrução da Justiça. Essa etapa mira diretamente figuras ligadas ao núcleo político do governo Bolsonaro, incluindo o ex-ministro do Turismo, Gilson Machado, que foi efetivamente detido pela Polícia Federal em Recife, também nesta sexta-feira.
Enquanto Gilson era conduzido sob custódia, os agentes já haviam chegado à residência de Cid, iniciando os procedimentos para cumprir a ordem judicial. Contudo, no meio da ação, veio a inesperada decisão do ministro do STF: a revogação imediata do mandado, antes mesmo de sua conclusão.
A Investigação: Obstrução de Justiça em Foco
A nova frente investigativa conduzida pela Polícia Federal se concentra em possíveis articulações para interferir nas investigações da Justiça, mais especificamente nas ações que apuram uma suposta trama golpista. Mauro Cid já vinha sendo uma figura central nesses inquéritos por sua proximidade direta com o ex-presidente Jair Bolsonaro e por seu envolvimento em episódios anteriores de relevância jurídica, como o caso das joias sauditas e a falsificação de cartões de vacinação.
Segundo fontes ligadas ao Supremo Tribunal Federal, a prisão de Cid estaria vinculada à conduta de Gilson Machado, que, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), teria atuado diretamente para obstruir a investigação em curso. Moraes, então, determinou a detenção de ambos como forma de preservar a integridade da apuração.
Depoimento Decisivo
Com o mandado revogado, Mauro Cid não foi preso formalmente, mas acabou sendo levado para prestar depoimento à Polícia Federal. A leitura dos bastidores é que sua liberdade, neste momento, está condicionada ao conteúdo do que ele revelar às autoridades.
A revogação repentina levanta hipóteses de que Moraes possa ter optado por dar uma nova chance ao militar de colaborar com as investigações, talvez até com a expectativa de que ele reforce ou complemente delações anteriores. O depoimento, portanto, pode ser decisivo para seu destino jurídico.
Fontes próximas ao STF indicam que Alexandre de Moraes estaria utilizando uma estratégia de pressão e flexibilidade, alternando medidas duras com sinais de abertura à colaboração, conforme o comportamento dos envolvidos. Trata-se de uma tática já observada em outras operações que envolvem o entorno do ex-presidente.
Mauro Cid e o Cerco Judicial
A trajetória recente de Mauro Cid o coloca no centro das investigações mais sensíveis relacionadas à gestão Bolsonaro. Como ex-ajudante de ordens, ele tinha acesso direto ao presidente e participou de eventos estratégicos nos bastidores do poder. Por isso, seu nome aparece recorrentemente nos inquéritos conduzidos pelo STF e pela PF.
Além do caso das joias e dos cartões de vacinação, Cid já admitiu, em colaboração premiada, envolvimento na preparação de um texto golpista que circulou no final do mandato de Bolsonaro. Suas declarações anteriores têm sido peças-chave para destrinchar os bastidores da tentativa de desestabilização institucional no país.
Nesse contexto, uma nova prisão poderia reforçar a tese de que ele estaria tentando recuar em suas colaborações ou teria se envolvido novamente em algum tipo de interferência nos processos investigativos.
Gilson Machado: Outro Alvo da PF
Enquanto a situação de Mauro Cid gerava tensão em Brasília, outro protagonista do entorno bolsonarista era capturado em Recife. O ex-ministro Gilson Machado, conhecido por seu papel político e por manter uma linha fiel ao ex-presidente, foi preso por suposta tentativa de atrapalhar o andamento do processo relacionado à tentativa de golpe de Estado.
Segundo a Procuradoria-Geral da República, Machado teria feito movimentos considerados obstrutivos e tentado desmobilizar testemunhas ou influenciar provas. Sua prisão sinaliza um novo momento na apuração, onde não apenas os executores ou articuladores estão sendo visados, mas também aqueles que, posteriormente, tentam desestabilizar o trabalho da Justiça.
Estratégia Judicial de Moraes
A decisão de revogar a prisão de Cid mostra um traço já conhecido na atuação de Alexandre de Moraes: a estratégia cirúrgica e controlada, em que ações contundentes são equilibradas por ajustes pontuais de rota, conforme o desenrolar das investigações.
Essa postura reforça a imagem de Moraes como um magistrado que prefere preservar os resultados de longo prazo das investigações, mesmo que isso signifique tomar decisões inesperadas no curto prazo. Ao liberar Cid momentaneamente, ele pode estar dando margem para novas informações ou tentando evitar que uma prisão prematura prejudique eventuais colaborações em andamento.
Conclusão: Jogo Político e Jurídico em Aberto
O cancelamento da prisão de Mauro Cid, em plena execução da ordem, adiciona mais um capítulo de tensão e imprevisibilidade no contexto das investigações sobre o ex-governo. Mostra que as decisões do Supremo Tribunal Federal continuam sendo moldadas por uma lógica dinâmica e estratégica.
A depender do teor do depoimento de Cid, o futuro do militar pode pender entre a liberdade provisória e uma nova ordem de prisão. Por enquanto, tudo indica que o destino de Mauro Cid está nas mãos dele mesmo — e da disposição em manter a colaboração com as autoridades.
Enquanto isso, a operação da PF segue em curso, mirando o que parece ser uma rede organizada de resistência ao avanço da Justiça. E cada movimento processual, como o desta sexta-feira, revela o quanto a crise institucional no Brasil ainda está longe de um capítulo final.